“Coimbra com Centro, Um Centro com Gente” foi
o mote para o debate realizado na noite de 17 de Julho pelo Movimento
Cidadãos por Coimbra sobre Reabilitação Urbana. Mais de meia centena de
cidadãos fizeram questão de ocupar simbolicamente e tornar vivo o
Terreiro da Erva. Situado junto às ruínas e crateras abertas na Baixa de
Coimbra pelas demolições realizadas a pretexto da vinda do Metro de
Superfície, a poucos metros da R. da Sofia, classificada de Património
Mundial, mas em elevado estado de degradação e abandono, este espaço
degradado da Baixa poderia ser um dos focos de uma intervenção exemplar,
no sentido de requalificar e revivificar o centro histórico, em
particular a partir da economia criativa.
A
reabilitação do centro histórico foi considerada unanimemente pelos
intervenientes como a prioridade das prioridades para Coimbra, para a
qual é necessária uma forte vontade e decisão política e planos de acção
concertados em várias áreas no sentido de trazer gente para a Baixa e a
Alta. Sem a promoção da habitação, considerou o candidato à Presidência
da Câmara, José Augusto Ferreira da Silva, não será possível recuperar o
centro histórico e a classificação como “Património Mundial” não
passará de um título vazio.
José
António Bandeirinha, arquitecto e candidato à Assembleia Municipal,
sublinhou a importância e o valor de Coimbra como eixo articulador do
território situado entre as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, bem
como do território que se estende para as cidades do interior e até no
contexto ibérico. Para exercer este papel, fundamental numa perspectiva
de desenvolvimento, Coimbra necessita, segundo Bandeirinha, de
densificar e consolidar um centro que se estende a toda a cidade
infra-estruturada. Rejeitando políticas que continuam a optar pelo
licenciamento de construção nova em zonas periféricas que promovem o
desmembramento da cidade e tornam incomportáveis o custo da extensão de
infra-estruturas e da gestão de outros serviços, Bandeirinha sublinhou
que a requalificação do centro passa por intervenções de qualidade no
edificado e, sobretudo, pela intervenção no espaço público. Segundo o
arquitecto, é indispensável vontade política para que os serviços
públicos de âmbito local, regional e nacional não abandonem o centro,
como tem vindo a acontecer, preservando-se assim as âncoras que trazem
as pessoas ao núcleo da cidade. Sublinhou ainda que a intervenção no
espaço público não pode ser uma questão de gosto, mas uma intervenção
inclusiva, com atenção às acessibilidades, que permita a todos/as os/as
cidadãos/ãs sentir e apropriar-se desse espaço como seu. Para
Bandeirinha, património é exactamente esse espaço vivo e ocupado com o
qual todos/as nos relacionamos.
No
mesmo sentido, Luísa Bebiano Correia, arquitecta candidata à Assembleia
de Freguesia de Santo António dos Olivais, advertiu para os perigos da
transformação do “património” num espaço musealizado e mercantilizável,
para consumo turístico, secundarizando a sua dimensão viva. A partir de
um estudo que realizou na pequena fábrica de louça pintada à mão que
funcionava no Terreiro da Erva, Luísa Bebiano reflectiu sobre o papel da
arquitectura na intervenção sobre espaços e edifícios que carregam
consigo a memória de quem os habitou, neles trabalhou, sobre eles pensou
e neles viveu percursos diversos. O trabalho de arquitecto
transforma-se, assim, num olhar e ouvir e numa relação de afecto.
Salientou como a fábrica desactivada foi já objeto de um projecto na
área da arquitectura e do design, proposto à Câmara Municipal de
Coimbra, inclusivamente com propostas de outras intervenções de
reabilitação no Terreiro da Erva, e que esta tem sucessiva e
absurdamente recusado. Para Luísa Bebiano, os edifícios vazios,
degradados e entregues à especulação devem ser sujeitos a políticas de
expropriação e de ocupação ativa, nomeadamente para e por pessoas sem
habitação, no contexto da crise atual. Esta ocupação ativa tem ainda a
vantagem de transformar os edifícios em lugares de afetos, dado o
envolvimento colectivo na sua reabilitação. Segundo a arquitecta, a
reabilitação do centro tem de passar por intervenções de diversas áreas,
nas quais a cultura assuma papel central.
Por
fim, Francisca Moreira, estudante, descreveu a sua experiência como
comerciante da Baixa, proprietária da loja “Gang of Four”, sita
inicialmente no Terreiro da Erva e depois na rua Visconde da Luz.
Francisca Moreira descreveu os obstáculos quase intransponíveis que
enfrenta quem quer instalar negócios na Baixa, os quais começam no preço
extremamente elevado das rendas dos espaços e se estendem às condições
absurdas impostas pela burocracia camarária, passando pela insegurança
devida à falta de gente na Baixa e à falta de policiamento adequado.
Elogiando iniciativas como as “Noites Brancas”, da Agência para a
Promoção da Baixa, Francisca Moreira propôs a captação de lojas âncora
pela Câmara e salientou a necessidade de os comerciantes se empenharem e
colaborarem em rede, de modo a criar sinergias que o fortaleçam na
concorrência com os centros comerciais, aos quais os poderes camarários
atribuem todo o tipo de facilidades que não concedem aos empresários no
centro histórico.
O
debate que se seguiu deu voz a intervenções pertinentes da plateia.
Entre outros, Pedro Bingre, candidato à Câmara Municipal, reforçou a
necessidade de promover a habitação, num contexto historicamente novo
que é o da desvalorização do imobiliário e da crise do sector da
construção, criando, como propõe o Movimento Cidadãos por Coimbra, uma
Agência Municipal de Arrendamento. Serafim Duarte, candidato à
Assembleia Municipal de Coimbra, chamou a atenção para o abandono dos
Colégios da Rua da Sofia, sugerindo a sua recondução à função
historicamente original de residências universitárias, o que permitiria
trazer gente para a Baixa. Chamou ainda a atenção para a falta de
operatividade da Sociedade de Reabilitação Urbana, nomeadamente na perda
de várias oportunidades de candidatura a fundos europeus para a
reabilitação urbana. António Luís Quintans, comerciante, fez o historial
da decadência do comércio na Baixa, responsabilizando os poderes
públicos pelo desleixo que leva ao encerramento de lojas durante vários
anos e pela falta de regulação, entre outros, dos valores do
arrendamento de espaços comerciais.
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